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O Memorial da História em Quadrinhos da Paraíba é um projeto de extensão e pesquisa do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal da Paraíba

Edição:
Henrique Magalhães

Contato: henriquemais@gmail.com

Equipe editorial:
Paloma Diniz

Cobaloradores:
Cristovam Tadeu (detalhe de ilustração para o cabeçalho)

Criou-se em julho de 2013, com fluxo contínuo de atualizações.

   Personagens - Maria

Repressão que não está no gibi

Nascido no período da Ditadura Militar, os quadrinhos paraibanos sofreram algum tipo de censura pela política dos 'anos de chumbo'

Audaci Junior

Quando estourou a Ditadura Militar no Brasil, há 50 anos, os quadrinhos paraibanos estavam apenas começando com o surgimento da revista As Aventuras do Flama, criação radiofônica de Deodato Borges que migrou para o papel um ano antes do golpe.

“Contudo, foi durante o período de exceção que surgiu a maior onda de produção de nossos quadrinhos, a partir do início da década de 1970 com o lançamento dos suplementos dominicais O Norte em Quadrinhos, do jornal O Norte, e O Pirralho, de A União”, explica o quadrinista e editor Henrique Magalhães. “Estes dois suplementos abriram as portas aos jovens quadrinistas amadores, que se aventuravam a publicar suas recentes criações. Dentre esses quadrinhos havia personagens infantis e de aventuras, super-heróis e tiras humorísticas”.

Magalhães conta que, não obstante a situação política repressora vigente no país na época, não havia nenhum impedimento aos quadrinhos produzidos no Estado porque se tratava de obras que expressavam bastante ingenuidade em sua maioria.

A maior criação do quadrinista, a contestadora e militante Maria, foi criada em 1975, no auge dos ‘anos de chumbo’. “Desde o início, a personagem tinha teor crítico aguçado, que se ampliou com minha entrada na universidade (UFPB), em 1976”, relembra. “A partir daí, a conotação política da personagem prevaleceu sobre seu lado intimista, questionando dos desmandos do poder”.

De acordo com Henrique Magalhães, havia vigilância cerrada às publicações, que tinham que ter o aval da censura, conduzida pela Polícia Federal. “A revista Maria, para ser liberada, teve que passar pelo ritual de intimidação da polícia, mas foi liberada sem problema”.

Henrique aponta que a publicação das suas tiras diárias no jornal O Norte não tiveram nenhum impedimento quanto às críticas políticas e sociais. O paraibano afirma que era interessante aos jornais ter certo tom de contestação e sua personagem cumpria esse papel em paralelo às charges. “No jornal A União, onde a personagem também foi publicada em tiras diárias, não houve problema enquanto se questionava a política nacional, mas foi censurada quando passou a abordar temas locais”.

Um exemplo que Henrique recorda é uma capa de O Pirralho, onde mostra uma criança enclausurada em casa, vendo pelas janelas com grades as outras crianças brincando livremente. A palavra ‘anistia’ foi limada do contexto.

Tiras de um conflito de terra
Nos anos 1970, “o conflito de terras em Alagamar foi o calo do governo Tarcício Burity”, recorda o quadrinista e editor Henrique Magalhães. “Houve certa tensão com a Cantata pra Alagamar, texto de W.J. Solha em forma de cordel, musicado pelo maestro José A. Kaplan”.

Além da ópera camponesa de Solha criada no final da década de 1970, o embate na fazenda de Alagamar envolvendo trabalhadores rurais sem terra de Itabaiana e Salgado de São Félix, no interior da Paraíba, também inspirou o autor de Maria para tocar no vespeiro do tema proibido, principalmente em um órgão oficial governamental como o jornal A União.

“Talvez por imaturidade ou por provocação, fiz uma série de tiras abordando o conflito de Alagamar, que naturalmente não poderia ser publicada pelo jornal”, explica o paraibano. “Por causa dessa série fui expulso aos gritos pelo editor da época, que não vem ao caso citar o nome. Antes mesmo já havia notado pequenas rasuras nas tiras mais politizadas, com o  objetivo de cortar palavras que pudessem incomodar politicamente”.

Apesar do constrangimento da censura às suas tiras, Henrique Magalhães percebeu que estava “gritando no fórum errado”, mesmo em um momento em que se lutava por liberdade de expressão. “O editor, mesmo que sem tato, tinha seus motivos para defender as normas do órgão oficial do governo. Esse episódio foi noticiado pelo jornal O Momento, que fazia  oposição declarada ao governo. As tiras foram reunidas numa das edições da revista Maria, cuja chamada de capa foi Alagamar”, informa.

CANTATA
A Cantata pra Alagamar se baseou no ‘Hino de Alagamar’, um pequeno texto escrito pelo camponês Severino Izidro.

Ambos os autores da obra já adotaram a Paraíba como lar: o paulista W.J. Solha e o regente argentino José A. Kaplan (1935-2009).

A cantata que retratava a luta pela terra por trabalhadores rurais estreou em 1979, na histórica Igreja de São Francisco, Centro de João Pessoa. No mesmo ano, a composição musical foi lançada em LP pela gravadora Marcus Pereira.

Repressão que não está no gibi. Audaci Junior. Paraíba: Jornal da Paraíba, 1 de abril de 2014, Vida & Arte, p.1 e 3.

 

 

 

 


Abaixo a ditadura
Maria, de Henrique Magalhães, teve que passar pelo ritual de intimidação da censura

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